Vazanteiros: vida nas águas

Vazanteiros

“Nós somos como o rio, sofremos com ele quando suas nascentes secam, seu leito se enche de areia, suas águas diminuem, perdem força, são represadas, poluídas, degradadas. O nosso reconhecimento é o reconhecimento do rio, o São Francisco não pode ser revitalizado sem nós, o povo Vazanteiro. A história conta, é nosso dever, nosso direito.” (CPT, CAA 2015)

Os moradores das margens ou das ilhas do rio São Francisco, praticantes da pesca artesanal e da agricultura de vazante, se autodenominam vazanteiros ou ilheiros, sendo que a primeira denominação é a mais utilizada nas comunidades; também encontramos expressões como “lavrador de vazante, conhecido como barranqueiro”, ou “lameiro" que era o plantador de vazante - aquele que plantava sobretudo no ‘lameiro das ilhas’ ou das ‘croas’ [coroas]” ou “varjeiros ou varzeiros" que são aquelas populações tradicionais que vivem às margens dos rios e várzeas.

Como conhecedores do meio ambiente, do clima e, sobretudo, das áreas de vazante das águas, os vazanteiros interagem cotidianamente com as alterações do rio São Francisco e dos rios do entorno, afluentes e lagoas. As áreas muito férteis são as vazantes, local onde realizam o cultivo nestas porções de terras sazonalmente inundáveis, para isso desenvolveram técnicas no território, conjuntamente com a criação de animais, a pesca e o extrativismo.

Ser vazanteiro significa reconhecer os ciclos naturais das águas, usufruindo das regiões fertilizadas por matéria orgânica proveniente da vazante; o que implica algumas alternâncias no que concerne ao local de moradia, assim, eles ocupam também as terras altas em períodos de cheia, sendo seu modo de vida marcado pela transumância entre terras de vazante e terras altas.

O rio, mais que um corpo de água, é visto e entendido como uma entidade, um lar, um parente, “as terras crescentes são a expressão da generosidade do rio na relação com os vazanteiros. Se o rio toma uma terra, ele devolve, em outro lugar, a terra renovada e fertilizada pela enchente, de forma que eles nunca fiquem sem terra para trabalhar e viver” (Oliveira 2024).

Entre memórias, afetos, relações de parentesco e afinidade circulam práticas, conhecimentos, bens, alimentos, folias, batuques, festejos, alegrias de ser-vazanteiro; uma identidade atualizada nas relações entre as gerações mais velhas e mais novas, diretamente formada em relação com o Rio São Francisco.

Ameaças

Grilagem das terras, desmatamento em larga escala da mata seca; irrigantes que usam de forma intensiva as águas do rio São Francisco que se encontra em processo final de exaustão.